Antes de começar, um aviso: esse texto nasceu de dois posts de Facebook e um convite do Marco para publicar uma versão estendida aqui. Não tem a menor pretensão de esgotar o assunto ou funcionar como um guia turístico, ok? Posto isso, vamos lá!
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O ato de viajar desperta o sociólogo em cada um. Ficamos tecendo teorias mais ou menos absurdas sobre o porquê de um lugar ser diferente, melhor ou pior, do que o nosso próprio país.
A Colômbia foi uma grande surpresa. Dez dias em Bogotá e Cartagena das Índias não me dão o direito de dizer que conheço o país, mas as primeiras impressões, nossa.
Pessoas maravilhosas, boas, honestas, dignas. Que sabem receber bem o turista, que tentam vender o seu peixe, às vezes de forma bem insistente, mas que não tentam te enganar ou roubar. O único sujeito que tentou nos aplicar um golpe (de que tinha acabado de ser assaltado e precisava trocar uma nota de 20 dólares mais fria que a Islândia) era, vejam só, um americano. Tentou passar a conversa justo nos brasileiros, coitado.
Em outra oportunidade, caminhávamos por uma rua meio deserta, à noite, com sacolas de compras, e um sujeito veio vindo na nossa direção. Quando chegou bem perto, começou a puxar uma coisa de dentro do casaco. “Faca ou revólver?”, pensei. Era um bibelô estilo pré-colombiano que ele queria nos vender.
Nunca comi melhor na vida, nem na Europa. Culinária típica, peruana e de tudo que é canto da Ásia.
Em qualquer bom restaurante de shopping se come melhor do que num restaurante metido da minha cidade, e pela metade do preço. As contas geralmente ficavam em 50 reais por pessoa.
E não é que os preços sejam baixos: eles são apenas justos, o Brasil é que está cada vez mais fora da realidade. Comprei dois casacos e duas camisas bem bons lá pelo mesmo valor que costumo gastar aqui numa ida semanal ao supermercado.
Sociologia barata alert: sei lá, talvez o fato de terem enfrentado e sobrevivido a décadas de guerrilha e narcoterrorismo tenha dado aos colombianos uma certa liga, um caráter nacional que não temos. É uma sociedade cheia de problemas e contradições, como todas, mas que parece ter muita coragem e disposição para enfrentá-los. Eles parecem operar o tempo todo de acordo com a mesma bússola moral, não importa a classe social, etnia, sexo, orientação sexual etc. Há um senso de coletividade, as coisas não parecem funcionar na base do todos contra todos.
Fora isso, me pareceu também um país que soube acolher e integrar um pouco melhor seus negros e índios: no geral parece haver mais respeito e menos preconceito.
Algumas notas rápidas sobre Bogotá
- Em qualquer lugar que tu entre, seja farmácia, loja, supermercado, táxi, tá SEMPRE tocando um reggaeton ou uma salsa furiosos e bons de ouvir. O reggaeton e a salsa são o sertanejo pop deles. Aqui tem uma rádio, pra pegar o clima.
- Eles têm quase 400 km de ciclovias, mas ciclovias MESMO: protegidas do trânsito por barreiras de concreto, largas, sem buracos, seguras. Me senti mais tranquilo andando de bicicleta aqui do que em Berlim. E aos domingos e feriados, as principais ruas são fechadas pro povo pedalar, caminhar e correr.
- Muitas lojas legais, diferentes, bonitas e atraentes, em especial nos bairros Zona Rosa, Zona G, Quinta Camacho e Parque de La 93. Também existem alguns shoppings gigantes em bairros mais afastados, como o C.C. Titán. Nesta área, a melhor dica que posso dar é a seguinte: chegando lá, procure o guia Lure, distribuído gratuitamente em algumas lojas e tranquilo de carregar pra lá e pra cá. São mais de 100 páginas de mapas e dicas muito boas de restaurantes, atrações e lojas.
- Uma dica específica de restaurante: Wok, uma rede de comida asiática e frutos do mar em geral, com preços bem razoáveis e um menu fora da curva. Mas não acredite na minha palavra: aqui tem o cardápio deles.
- Tem um programa na TV chamado En La Zona, com entrevistas direto da zona. A zona, no caso, é a porção do país que estava em poder das Farc. Entrevistam os guerrilheiros sobre o acordo de paz, expectativas pro futuro etc.
- Em Bogotá, longe das zonas de conflito, tem guarda POR TUDO, aos montes, em grupos de 3, 4, 5. Sensação grande de segurança.
- No geral, as pessoas têm aquela dignidade intrínseca que no Brasil só se encontra no interior profundo e mesmo assim procurando bem. É um Uruguai mais faceiro e colorido.
- Nos cardápios sempre tinha um suco que parecia meio bizarro pra gente: limonada de coco. Como assim? É limonada + leite de coco, uma combinação MARAVIJOSA.
- Por toda a cidade, ótimos cafés. Recomendo um espresso acompanhado de uma arepa de queso, que é um bolinho de farinha de milho com queijo, suave e saboroso.
Agora, notas rápidas sobre Cartagena
Ao contrário de Bogotá, que é bem seca e tem um clima ameno, Cartagena é mega úmida e quente, era sair do hotel e começar a suar em bicas.
O mais legal da cidade está na parte que fica dentro da muralha, a Ciudad Vieja. Muitas lojas, atrações turísticas, museus, igrejas e restaurantes. Dos que fomos, recomendo especialmente o El Kilo (que também tem em Bogotá) e a Cevichería, ambos de frutos do mar. Até andamos por outros bairros como Getsemani (boemia hostel) e Bocagrande (negócios), mas o melhor acontece mesmo é na Ciudad Vieja, procure se hospedar por lá, se possível.
O casario colonial vale um parágrafo próprio: casas lindas, coloridas, com belas sacadas de madeira se projetando sobre a rua, muitas vezes cobertas de folhagens, e portas enormes, majestosas. Prepare-se para tirar muitas fotos.
Para ir nas praias legais, aquelas com águas quentes e clarinhas, é melhor ir de excursão, geralmente com almoço (simples e maravilhoso) incluído. Fomos a isla Baru e foi uma experiência bem interessante. Mas atenção: prepare-se para dizer “No, muchas gracias” muitas e muitas vezes, porque a comunidade local, que vive do comércio estará a postos para te vender de comidas e bebidas a pulseiras e massagens. Chega a ser engraçada a insistência, mas é melhor levar na esportiva, porque são apenas pessoas boas sustentando suas famílias.
Fora isso, há que se respeitar uma civilização que consome tigelas de feijões vermelhos e enormes em pleno café da manhã.
Pra quem tinha como as maiores referências do país a série Narcos e o HIGUITA, fiquei positivamente surpreso: é um país muito massa, surpreendente mesmo.
Recomendo muito a viagem pra quem puder, quando puder.